domingo, 22 de abril de 2012

O Barcelona é melhor!



Ontem, 21 de abril, em pleno Camp Nou, o Real Madrid venceu o Barcelona, de Messi e Cia.
Cristiano Ronaldo marcou o segundo gol dos merengues e estabeleceu novos recordes pessoais e da equipe, praticamente assegurando por antecipação o título do Campeonato Espanhol de 2012.
Apesar disso, o Barcelona é melhor! Explico meu ponto de vista.

Não acredito que as partidas de futebol - ou qualquer outra disputa desportiva - constituam a metáfora ideal da vida. Para alguns é assim, motivados pelo embate entre adversários, o clima competitivo e uma suposta meritrocracia que, ao final, parece indicar que o melhor, mais competente e bem preparado entre os adversários será, na enorme maioria das vezes, o vencedor.
O recurso à metáfora do jogo ou da disputa, como queiram, é próprio da ideologia do individualismo possessivo, especialmente quando transplantada para o "mundo das coletividades", empresas, grupos e nações. Há sempre alguém contra alguém e o esforço do conjunto dirige-se a superação do adversário comum.
A ideologia do "mercado" nutre-se dessa ordem de representação das relações sociais. A solidariedade produzida neste cenário, que se espera operar na base da atuação da "equipe", não coloca em questão o caráter fugidio, vago e transitório das vitórias ou as conseqüências mais duradouras e dolorosas das derrotas, assumidas como parte do destino normal ou natural de quem participa das contendas. "É preciso saber perder"!
São vários os contextos em que a metáfora do jogo sustenta o discurso de escolhas mais arbitrárias do que se costuma admitir e, reconheça-se, muito influenciadas por fatores não dominados pelos participantes.
Ascensões funcionais na iniciativa privada e no serviço público, em regra anunciadas como expressão do mérito superior do eleito, na maior parte do tempo escondem escolhas pautadas pela identificação com as políticas dominantes, por isso mesmo menos capazes de alterar o quadro ou impulsioná-lo com a chegada de um "valor" em tese mais qualificado. Claro que há exceções à regra e são as exceções a propaganda preferencial dos critérios de mérito.
A questão que quero discutir, no entanto, é outra. Ela diz com a superação. Pessoal e do grupo.
Mesmo o fantástico Santos de Pelé sofria seus reveses. Foram significativas as vitórias do Botafogo, de Nilton Santos e Garrincha, e do Cruzeiro, de Tostão e Dirceu Lopes, sobre o Peixe, com Pelé, Coutinho, Pepe e outros incríveis jogadores.
Assim, também ficaram marcadas na história do futebol as vitórias do Galo (Atlético MG), de Reinaldo e Cerezo, e do Vasco da Gama, de Roberto Dinamite, sobre a vencedora equipe do Flamengo, no fim dos anos 70 e início dos 80, com Zico, Junior, Adílio, Tita e grande elenco.
Em todas essas oportunidades, como neste último Barcelona versus Real Madrid, algo distinto da mera competitividade pode ser destacado: a ideia da superação a partir do exemplo do "melhor".
O melhor, que pode ser o mais habilidoso, criativo, espontâneo, estimula por seu exemplo a superação pessoal dos que de algum modo estão em contato com ele, ainda que, por circunstâncias, na condição de adversários.
Há algo de contagiante no indivíduo que se destaca por méritos que admiramos por envolverem algo distinto da força (física, econômica etc.). Determinadas qualidades que desejamos em nós mesmos e que dizem com o belo e o bom e, ainda, que não se orientam a causar mal a outras pessoas. São qualidades que proporcionam o gozo, o prazer e em lugar da destruição, da terra arrasada, que determinadas vitórias deixam para trás, constroem novas trilhas, apontam para caminhos até então desconhecidos, verdadeiramente inovadores.
Dessa convivência, real ou virtual, com o "melhor", neste sentido, todos nos beneficiamos de alguma maneira. O "melhor" estimula em cada pessoa o que ela tem de valioso, a inspira e a leva a superar-se.
O resultado prático momentâneo é secundário.

Para ficarmos com as metáforas e ilustrações do futebol, o jogo mais emocionante de 2011 foi Santos 4 x 5 Flamengo, na Vila Belmiro, com estupendas atuações de Neymar e Ronaldinho.
Não era preciso ser um expert em futebol para saber que o jogador rubro-negro, que reinventou o futebol em diversos momentos naquela partida, raramente repetiria a dose. O fenômeno fora provocado pela ousada e exuberante exibição do craque Neymar, que para além de também reinventar o futebol, cuidou de revogar leis da Física de todos os tempos, maravilhando os presentes e aos que assistiram ao jogo pela televisão.
Fora como se Neymar provocasse em Ronaldinho o melhor deste último, incentivando-o a revelar-se ao público que, deslumbrado, independentemente das predileções clubísticas, devorava cada instante do espetáculo.
Jogo para ver e rever milhares de vezes. E cena para não ser esquecida: ao final, a alegria de Neymar, estampada em seu rosto, convicto de ter participado de uma partida que pressentira histórica, pouco importando o resultado. Como se soubesse - ou intuísse - que fora ele o responsável pela apoteose estética que contagiou quem dela assistiu ou tomou conhecimento.
Sem dúvida que o Real Madrid tem seus méritos. E Cristiano Ronaldo é um baita jogador, craque de verdade, disso ninguém igualmente pode duvidar. Mas se há algo, além de tudo, que o Barcelona e Messi proporcionaram foi incentivar o Real Madrid e Cristiano Ronaldo a se superarem, a fazerem melhor o que já faziam bem, a inovar, criar, buscar alternativas. A unir à eficiência o talento e a tornar belo o espetáculo do futebol.
Na grande maioria das situações cotidianas o "melhor", que nos inspira e incentiva, não é nosso adversário. Com bastante freqüência ele está ao nosso lado e é a capacidade de olhar e enxergá-lo, despindo-se de preconceitos, que nos faz melhorar também.
Foi o que o Barcelona fez com o Real Madrid... e por isso o Barcelona é melhor!

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