quinta-feira, 27 de maio de 2010

Grupo de Pesquisa

No blog do Grupo de Pesquisa sobre as Matrizes autoritárias do processo penal brasileiro eu coloquei um release da reunião de ontem, na Faculdade Nacional de Direito.

É isso!

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Anistia ou amnésia: um debate necessário

No último dia 29 de abril o STF decidiu por sete votos a dois, no julgamento da ADPF 153, manter o entendimento pelo qual os crimes de tortura, desaparecimento e homicídio praticados por agentes do Estado durante a ditadura de 1964 ("crimes comuns praticados pelos agentes da repressão contra opositores políticos, durante o regime militar"), se inscreviam entre os crimes políticos e conexos afetos à anistia definida pela Lei n. 6.683/79.
O Conselho Federal da OAB postulou declaração/interpretação do §1º do artigo 1º da referida lei que não ofendesse preceitos e princípios fundamentais, consagrados pela Constituição.
O julgamento acirrou o debate - e os ânimos - em torno de nosso passado recente e provocou enfrentamentos retóricos nos mais variados ambientes entre os que querem deixar "o passado no passado" e aqueles que entendem que somente "o conhecimento integral do que se passou" na ditadura militar propiciará ao Brasil construir "objetivos seguros e um amplo compromisso consensual... para que tais violações não se repitam nunca" (prefácio ao Plano Nacional de Direitos Humanos - PNDH 3).
Ao lado da tensão desta decisão do STF há o PNDH 3, constituído após ampla e transversal discussão entre setores das várias esferas de Governo e a sociedade civil organizada, a partir da convocatória de abril de 2008 (Decreto Presidencial e Portaria 344 da Secretaria Especial de Direitos Humanos - SEDH), que culminou com a 11ª Conferência Nacional dos Direitos Humanos, realizada em Brasília entre 15 e 18 de dezembro de 2008.
Precedida por mais de uma centena de encontros e Conferências Nacionais temáticas, a 11ª Conferência gestou as bases do PNDH 3, que hoje está no centro das discussões, alvejado intensamente pelas forças autoritárias que atravessam a sociedade brasileira e jogam o jogo das pemanências, ainda que sob a veste nova de um modelo de administração de conflitos que dispensa a rude transparência das ditaduras militares e de outros matizes que caracterizaram a América Latina no século XX.
Entre eixos prioritários e estratégicos, e ações e compromissos irrenunciáveis, o PNDH 3 propõe lutar pela erradicação da tortura (Diretriz 14 do Eixo Orientador IV) e por uma política da memória (Eixo Orientador VI).

Há muito tempo, em palestras, aulas e debates públicos eu venho defendendo, no campo mais restrito do funcionamento do Sistema de Justiça Criminal, que o caráter negociado de nossa transição, em um contexto em que as forças democráticas dispunham de muito pouca margem de manobra e poder de influência e em um momento em que o principal desgaste do governo militar brasileiro resultava do anunciado fracasso de sua política econômica altamente concentradora, incapaz de se esconder atrás de algum falso "milagre econômico", pesou na manutenção e difusão de uma subjetividade altamente autoritária.
O contexto global também contribuiu para isso, em minha opinião, concertando as bases do que Michel Foucault e Gilles Deleuze denominavam de "fascismozinho ordinário" (Filósofos na Tormenta, Elisabeth Roudinesco, Zahar, 2007, p. 10).
Recompor as bases da "transição", pela via da tessitura de novos vículos a partir da franca exposição de nosso passado recente, este pode ser um dos caminhos para a edificação de formas de sociabilidade que nos ajudem (à sociedade brasileira) a entender e a superar sua inclinação pela solução violenta e amarga dos conflitos, ao preço do sacrifício constante dos interesses dos grupos sociais mais vulneráveis em benefício das elites, que não deixaram de existir porque o termo foi condenado ao "politicamente incorreto", nesta gramática perversa e tendenciosa do neoliberalismo e da globalização de mercados e marginalização dos pobres do mundo.
Começo hoje a publicar posts em que busco articular as questões acima (julgamento do STF, PNDH 3) à Justiça de Transição e a outros temas correlatos. Tenho por horizonte o futuro e sei o quanto o assunto é delicado, pois muitos dos que hoje, honesta e sinceramente, estão envolvidos na concretização dos direitos humanos no Brasil conheceram, por modos variados, o outro lado, da violência de Estado, sem embargo das formas de convivência social, econômica, política e mesmo familiar com torturadores e chefes da ditadura. Mexer com o passado, inevitavelmente, é mexer com as pessoas e seus sentimentos e é nosso dever agir com sobriedade.
Minha perspectiva está em desatar nós para que as mudanças que estão em curso em nossa sociedade produzam de fato uma cultura de respeito aos direitos humanos que condene a repressão penal e a violência estrutural, estas sim, a serem "o passado a ser deixado no passado".
Vamos ver o que acontece!

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Liberdade e pena substitutiva em tráfico de drogas: a serenidade contra a obsessão punitiva

A decisão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça insere-se na linha da escrupulosa aplicação da Constituição, seguida pela 5ª Câmara Criminal do Rio de Janeiro, pela 5ª Câmara Criminal do Rio Grande do Sul e por outros órgão colegiados e por juízes como Alexandre Rosa e Rubens Casara.
Gradativamente forma-se jurisprudência criminal que transforma, em prol da Constituição, algo da face do sistema de controle social punitivo no Brasil.
A caminhada é árdua e começou lá atrás. Aos pioneiros hoje deve confortar a ideia de que a luta pela radicalização democrática não está sendo em vão!


Informativo 433 STJ - 6 Turma



TRÁFICO. DROGAS. REGIME FECHADO.

O crime imputado ao paciente foi tráfico de drogas praticado em 8/5/2008, já sob a égide da Lei n. 11.464/2007, cuja entrada em vigor se deu em 29/3/2007, que alterou o art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/1990, determinando o estabelecimento de regime fechado para o início do cumprimento da pena aplicada, qualquer que ela seja. A defesa do paciente alega que a quantidade imposta, a primariedade e as circunstâncias judiciais favoráveis autorizariam a imposição do regime aberto. Destaca o Min. Relator que, embora, segundo o art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/1990 (com a novel redação da Lei n. 11.464/2007), tenha sido vedado, expressamente, para os crimes hediondos ou a eles equiparados o regime inicial diverso do fechado, na fixação do regime prisional para o início de cumprimento da pena privativa de liberdade, há de levar-se em consideração a quantidade de pena imposta, as circunstâncias judiciais desfavoráveis ou favoráveis, a presença de agravantes, atenuantes, causas de aumento ou diminuição. Isso porque, no Estado democrático de direito, as normas devem mostrar-se ajustadas com o processo constitucional. Observa que a aplicação literal do artigo inserido pela Lei. n. 11.464/2007 na Lei dos Crimes Hediondos sem considerar as peculiaridades do caso concreto acarretaria ofensa aos princípios da individualização da pena, da proporcionalidade e da efetivação do justo. Ressalta que, em decisão plenária em 2006, o STF declarou a inconstitucionalidade da proibição à progressão de regime (art. 2º, § 1º, na redação antiga da Lei dos Crimes Hediondos) por afronta ao princípio da individualização da pena e só depois a Lei n. 11.464/2007 derrogou a vedação à progressão de regime. No entanto, ainda persiste a ofensa ao princípio da individualização da pena, pois se aquele dispositivo responsável por impor o integral cumprimento da reprimenda no regime fechado é inconstitucional, também o é aquele dispositivo que determina a todos, independente da pena ou das circunstâncias judiciais do caso concreto, que inicie a expiação no regime mais gravoso. Pelo exposto, conclui que, na hipótese dos autos, a pena de um ano e oito meses de reclusão aliada às circunstâncias judiciais favoráveis permite o estabelecimento do regime aberto para o cumprimento da pena privativa de liberdade e também a sanção corporal por duas medidas restritivas de direitos. Observou ainda que, no julgamento da apelação interposta pelo MP, o tribunal a quo, embora tenha aplicado a causa de diminuição contida no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, no patamar máximo de dois terços, deixou de efetuar a mesma redução em relação à multa, o que ocasiona o constrangimento ilegal alegado pela defesa. Com esse entendimento, a Turma estabeleceu o regime aberto para o cumprimento da privativa de liberdade, substituiu-a por prestação de serviços à comunidade e limitação de fim de semana, redimensionou a pena pecuniária de 332 para 166 dias-multa e determinou que a implementação das restritivas de direitos ficasse a cargo do juiz das execuções. Com essa decisão, a Turma modificou seu entendimento sobre o tema ao adotar o do STF. Precedentes citados do STF: HC 82.959-SP, DJ 1º/9/2006; do STJ: HC 128.889-DF, DJe 5/10/2009; HC 102.741-RS, DJe 16/11/2009; HC 130.113-SC, DJe 19/2/2010, e HC 154.570-RS, DJe 10/5/2010. HC 149.807-SP, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 6/5/2010.