Palestras e debates marcam o segundo dia do II Seminário de Justiça Criminal do CNJ
O II Seminário de Justiça Criminal do Conselho Nacional de Justiça teve continuidade nesta quinta-feira (7/10) com a palestra do desembargador Silvio Marques Neto, que representou a corregedora-geral do Conselho Nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon. Ele falou sobre o tema “Implantação do Plano de Gestão das Varas Criminais e de Execução Penal: o papel das Corregedorias Gerais”.
Silvio Marques lembrou que a primeira reflexão sobre um Plano de Gestão teve início durante o I Seminário, em 2009. O desembargador revelou o fato de que diariamente chegam ao Conselho Nacional de Justiça sugestões, dúvidas e reclamações a respeito de novos métodos de trabalho, que servem como ponto de partida para discussões sobre o estabelecimento do Plano de Gestão.
Ele lembrou ainda que o Judiciário não pode abrir mão de seu direito-dever de processar, julgar e fazer com que a pena seja cumprida em sua plenitude, isto é, chegando ao ponto de recuperar e reintegrar na sociedade aquele que se afastou de suas regras. “Ao Poder Executivo, quer seja pela sua Secretaria de Segurança, de Justiça ou de Administração Penitenciária, cabe apenas colaborar com o Poder Judiciário nessa sua atividade”, completou.
O conselheiro Walter Nunes da Silva Junior, do CNJ, falou sobre “Técnicas de gestão para a simplificação e celeridade da função jurisdicional criminal”. Ele revelou que, ao longo do tempo o CNJ, principalmente por meio dos mutirões carcerários e da atuação da Corregedoria Geral, vem identificando uma série de problemas que levaram à constituição de um grupo de trabalho para diagnosticar que modelo de Plano de Gestão deveria ser colocado em prática, plano este que ainda não está acabado, mas cuja aplicação vem sendo adotada em diversos pontos do País.
Em relação ao seminário, Walter Nunes disse que seu grande objetivo é difundir essa iniciativa de uma forma crítica. “Trata-se de um plano que não foi construído de cima para baixo; tenho certeza de que muitos de vocês que aqui estão participaram e ainda participam de sua elaboração, pois ele ainda não está pronto”, afirmou. E completou dizendo que a grande finalidade do Plano de Gestão é a adoção de rotinas inteligentes visando a melhoria dos trabalhos através do princípio da simplificação do processo.
Completando a programação da manhã, os juízes auxiliares da Presidência do CNJ Márcio André Keppler Fraga e Luciano Losekann, e o juiz auxiliar da Corregedoria Geral da Justiça do TJSP, Cláudio Pedrassi, falaram sobre o “Projeto Eficiência”.
Pedrassi começou falando da alegria de São Paulo em sediar o Seminário. Para ele, uma das maiores virtudes do CNJ foi fazer com que os tribunais se conheçam. O magistrado enfatizou a importância da Justiça Criminal ao lembrar que não foi à toa que o CNJ elegeu o ano de 2010 como o “ano da Justiça Criminal”. Ele citou alguns números para mostrar a situação do judiciário paulista. Em 1990 o Tribunal de Justiça de São Paulo tinha 54 mil servidores e 9 milhões de processos em andamento; hoje tem 45 mil funcionários e o número de processos dobrou – 18 milhões. Pedrassi revelou que, dentro da implantação do Plano de Gestão, estão sendo feitos estudos para a reestruturação das varas criminais. Segundo ele, "existe a ideia de trazer para o Foro Central todos os processos criminais, deixando para os Foros Regionais só casos de violência doméstica e aqueles atendidos pelos juizados especiais criminais."
O juiz Márcio André Keppler Fraga falou da atualidade de palavras e expressões como gestão, planejamento estratégico e metas. “Alguma coisa está errada com o Planejamento Estratégico do Poder Judiciário e esse erro está nos métodos de trabalho, na gestão. O processo de gestão nunca está pronto, acabado; está sempre em busca de se alcançar os melhores resultados através de métodos de trabalho.”
Ele citou o exemplo das fábricas de automóveis coreanas e japonesas, cuja eficiência tem atraído as grandes indústrias de veículos européias e americanas. “No Judiciário também é importante que se adotem novos e eficientes métodos de gestão para melhorar a produtividade dos servidores e do próprio Judiciário, assim como deveria acontecer também no Ministério Público e na Polícia.”
Luciano Losekann disse que o Projeto Eficiência surgiu da constatação de que o trabalho do magistrado não se esgota com o despacho, com a sentença. “Durante a realização dos mutirões carcerários foram detectados os tipos de problemas mais freqüentes nas unidades judiciárias. Problemas como estrutura física inadequada na maioria das serventias; excessiva e crescente demanda de processos; demora no cumprimento das atividades cartorárias; falta de qualificação e capacitação de servidores; ausência de organização funcional, método e rotina de trabalho, o que gera uma enorme insatisfação dos servidores, e outros”. Losekann citou também a solução apresentada pelo Projeto Eficiência, que passa pela valorização do capital humano, capacitação, movimentação e mudança de filosofia; melhoria da comunicação interna; maior compromisso dos magistrados e maior dedicação dos servidores; melhora no relacionamento entre os colegas e na integração entre juízes e servidores.
À tarde, em mesa presidida pelo juiz Márcio Keppler, o palestrante Francisco Paulo Soares Lopes falou sobre o “Aperfeiçoamento de Magistrados e capacitação de servidores pelas escolas de magistratura e pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (ENFAM)”. “Compete à ENFAM regulamentar, autorizar e fiscalizar cursos oficiais para ingresso, vitaliciamento e promoção na carreira da magistratura; aproximar ainda mais o Judiciário da realidade do cidadão; e facilitar a troca de experiências entre magistrados, além de ter como uma de suas iniciativas principais a criação de um ambiente de efetiva colaboração entre juízes”, explicou Francisco Lopes.
Na sequência, representantes de Corregedorias Gerais da Justiça de diversos tribunais brasileiros apresentaram práticas positivas implementadas nos Estados/Regiões a partir do Plano de Gestão das Varas Criminais, a saber: Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe – “Controle eletrônico da situação prisional de réu preso cautelarmente”; Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia – “Projeto Ressoar – Resgate Social do apenado em Rondônia”; Tribunal Regional Federal da 1ª Região – “Gabinete integrado de execução de penas e medidas alternativas da Seção Judiciária de Goiás”; Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul – “Sistema de consultas integradas com informações de segurança pública, departamentos de trânsito e Poder Judiciário”; Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios – “Requisição eletrônica de presos e policiais para audiências”; e Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – “Execução criminal / Força-tarefa / Super VECs – reestruturação das Varas de Execuções Criminais”.
Em mesa presidida pelo conselheiro Felipe Locke, do CNJ, o professor argentino Norberto Daniel Barmat proferiu palestra sobre o tema “Justiça penal consensual: perspectivas, propostas e limitações no direito e prática judiciárias brasileiros.”
Tendo atuado como advogado criminalista na província de Córdoba e também pela experiência em sua tese de doutorado sobre Justiça Restaurativa, o professor afirmou que “para neutralizar o dando causado à vítima ou ao ofendido, seu autor deve repará-lo. Mas, para isso, deve obter algum tipo de benefício como contrapartida”. Norberto Barmat dissertou ainda acerca do princípio da oportunidade e sua harmonização com a mediação nos processos na América Latina, com previsão legal em países como Peru, Guatemala, Venezuela, El Salvador e algumas províncias argentinas. “O princípio da oportunidade já está inserido na legislação brasileira, mas falta uma aplicação prática mais efetiva. O direito penal tem suas limitações e seria conveniente utilizá-lo como último recurso, quando outras soluções não forem possíveis. O sistema penal deve ser reservado aos casos mais graves. É indispensável buscar alternativas à sanção penal baseada na privação da liberdade”, concluiu o professor.
No término dos trabalhos, a justiça penal consensual foi debatida pelo juiz de Direito Luís Geraldo Lanfredi, do Tribunal de Justiça de São Paulo, e pelo desembargador Geraldo Prado, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Para Lanfredi, “a justiça penal consensual não foi materializada pelo advento, há quinze anos, da Lei nº 9.099/95, que instituiu a criação dos Juizados Especiais Criminais (JECRIMs) para resolver os crimes de menor potencial ofensivo, cujas penas não ultrapassem dois anos. Não conseguiu se impor como a nova justiça penal que todos desejávamos ou ao menos esperávamos. Mais JECRIMs não significaram menos delitos e menos problemas”. “Não temos como falar de consenso quando o Estado deixa de prestar o mínimo necessário para o bem-estar de todos. A experiência da aplicação prática da Lei nº 9.099/95 deve ser repensada, pois sua intenção, em alguns casos, foi menoscabada. A justiça penal consensual no Brasil, enfim, não se aproximou do jurisdicionado, mas encerrou-se em seu próprio egocentrismo. É necessário o investimento em uma nova cultura jurídica, interdisciplinar, em que haja a intervenção de profissionais de múltiplas áreas”, disse Luís Geraldo Lanfredi.
O desembargador Geraldo Prado, do TJRJ, por sua vez, entende que “com a lei dos Juizados Especiais Criminais, houve uma promessa de aceleração dos casos que, de fato, não ocorreu. Está errado a justiça penal consensual no Brasil passar pelo estabelecimento de pena”. Geraldo Prado encerrou sua fala afirmando: “A não acusação pode ser o caminho para a solução dos conflitos. É preciso quebrar mitos como a obrigatoriedade da ação penal. Temos mecanismos para avançar e podemos, a partir do dia-a-dia, superar esse quadro. Sem conhecer a realidade não se vai a lugar algum.”
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