segunda-feira, 26 de abril de 2010

Uma ideia na cabeça e uma câmera na mão!?


Das dores de cabeça mais comuns a professores e alunos, aos que de fato estão envolvidos com a atividade de investigação científica, sem dúvida a criação do texto, o colocar as ideias no papel, segue ocupando lugar de destaque.
Sou do tempo da Olivetti Lettera 22, a máquina de escrever portátil. E da folha em branco... que hoje se traduz na tela em branco, iluminada, mas em branco! Assustadoramente em branco.
Com a enxurrada de textos alheios a nos intimidar, invadindo nossas vidas por todos os lados, não raro fica-se com a impressão de que ao fim da pesquisa o poço secou e somente nós não conseguimos traduzir em palavras aquilo que "está na cabeça", maduro e pensado. Parece que é fácil para todo mundo, basta "uma ideia na cabeça e uma câmera na mão" e, pronto, o texto flui, menos o nosso!!!
Nos últimos tempos tenho me interessado pelo processo de criação.
Será isso mesmo... basta a ideia e se ela é boa... vapt, vupt... logo cá está o texto?
Em sua dissertação de mestrado sobre o filme "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964), do genial Glauber Rocha, Josette Monzanni desmistifica a frase charmosa, famosa, da ligação direta entre ideia e texto final.
O roteiro da película foi trabalhado por Glauber entre 1959 e 1963 e conheceu pelo menos cinco versões. Resultou de "um processo minucioso de planejamento".
Assim também são as músicas de Chico Buarque de Holanda, segundo o próprio, em seu depoimento nos DVDs que contam a trajetória inspirada do compositor.
Muito trabalho de escrita e revisão, medindo, examinando o lugar de cada palavra, sua adequação ao ritmo, ao enredo, à mensagem, tudo muito cerebral, mas nem por isso menos genial ou espontâneo se o que se entende por espontâneo tem a ver com a sinceridade, com o ato de transmitir aquilo em que se acredita!
Em suma, muito suor!
E essa harmonia a gente encontra - e aprende a admirar - nas mais diferentes obras.
Há quem goste, ame e até desteste Woody Allen. Eu estou entre os que, lá atrás, em 1977, ficaram fascinados com "Noivo neurótico, noiva nervosa" e depois, em 1985, com "A Rosa Púrpura do Cairo".
Sempre me intrigou esta capacidade de construir fantásticos diálogos em harmonia com a estória de fundo.
Os diálogos valendo por si, inspirados. Mas indiscutivelmente em associação com o restante do filme, em uma tessitura de contexto que me leva(va) a pensar em como é possível chegar ao resultado final, senão fazendo (filmando, construindo o roteiro?) de trás pra frente!
Foi assim em "Match Point" (2005) e agora no genialmente simples "Tudo pode dar certo", que assisti com a Gi neste sábado.
Voltando ao tema: o processo de criação esconde muito suor, acertos e desacertos. Para nós, felizardos leitores, ouvintes ou expectadores fica a "imagem" da simplicidade, do como é fácil, revelado pelo trabalho definitivo... e talvez aquela inveja positiva (gostaria tanto de ter pensado nisso antes!) agregada à sensação de impotência.
Bem... não há segredo. Estudar muito e trabalhar muito. Compor e recompor, com cuidado, atenção e paciência, e aprender com o que se fez, parece que este é o caminho.
Bom dia!
Obs. Se valem dicas de filmes em minha opinião geniais, que também estão em cartaz, sugiro: o coreano "Mother: a busca pela verdade" (Bong Joon-Ho) e o argentino "O segredo dos seus olhos" (Juan José Campanella).


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